sábado, 8 de agosto de 2009

Memorial

Enimara Lins
Meu nome é Enimara Ferreira da Silva Lins. Nasci em Ipupiara - Bahia, cidade localizada na Chapada Diamantina, onde morei até os dezessete anos de idade, vivenciei minha infância, fui alfabetizada e cursei o “primário” e o “ginásio” (denominações daquela época para o Ensino Fundamental e Médio), concluindo o magistério no ano de mil novecentos e oitenta e oito, quando, por motivos familiares, tive que mudar para Juazeiro / Bahia, cidade onde fixei moradia, constitui família e me profissionalizei, a qual estou residindo até hoje.
Estudei, durante toda a educação básica, em escolas públicas, onde tive a oportunidade de conviver e aprender com grandes mestres, profissionais comprometidos, que dedicaram uma vida para a educação, os quais não nomearei, sob pena de deixar de lembrar de algum deles, pois, todos ficaram e permanecerão presentes no âmago das minhas lembranças e recordações, sendo imensamente reconhecidos em cada conquista e vitória que permeiam minha trajetória profissional. A todos os mestres que contribuíram com minha formação acadêmica minha eterna gratidão.
Recordo-me bem do meu primeiro contato com a escola aos cinco anos de idade, quando, por força das circunstâncias fui alfabetizada. Lembro – me exatamente do cenário como se estivesse em loco: uma sala comprida, único cômodo, localizada em um beco (é assim que chamavam aquela viela) ao fundo de uma Igreja Batista do Sr. Artur (O líder da igreja que cedia o espaço para a sala de aula), uma mesa enorme ao centro, rodeada de bancos igualmente compridos, muitas crianças (de diferentes idades), ao redor da mesa. A professora? Uma autoridade! Venerada por todos da comunidade! Uma pequena lousa de compensado de cor verde, gizes brancos e coloridos, Posso visualizar a cartilha, os textos que nela continham os desenhos, principalmente o da foca com a bola e o das borboletas, primeiras palavras que li sozinha, de verdade!! E os exercícios pontilhados? A enorme régua que a professora trazia sempre em punho! Foi ali, naquela sala, sob a eficiência e rigidez da professora, naquele beco que era caminho da casa de farinha do meu avô materno, onde por curiosidade, entrava todos os dias, aos cinco anos de idade, que descobri a magia da leitura, o significado das letras.
Não sei como, mas permaneci na escola mesmo não tendo idade para fazê-lo. As séries seguintes, cursei no Prédio Escolar, local onde faço questão de olhar, visitar, contemplar, sempre que visito Ipupiara. Ali continha não apenas salas de aula, mas uma história de vida que foi narrada inúmeras vezes por minha avó materna, que havia morado naquele local por algum tempo, em função das dificuldades que enfrentara no período, quando eu ainda era recém-nascida.
Coincidentemente, foi ali, no mesmo prédio que concluí o magistério no ano de mil novecentos e oitenta e oito, quando o Centro Educacional Cenecista de Ipupiara, (colégio onde estudei da quinta ao terceiro ano), teve que ser removido para o referido prédio, para devolver ao estado o espaço físico onde o colégio funcionava, pois estaria sendo implantado um novo colégio estadual na cidade, no espaço onde funcionara a escola.
O fato é que sempre gostei muito de estudar. No primário, sempre me destaquei entre os colegas, o boletim sempre foi exibido para a família com excelentes notas, as festas e datas comemorativas sempre tinha uma apresentação com minha participação. Um fato marcante que registra esta afirmação se deu quando cursava a segunda série, tinha sete anos de idade e fui escolhida para recitar uma poesia. Era a comemoração do dia sete de setembro, inauguração da sede nova da Prefeitura Municipal, portanto data especial. A poesia tinha treze estrofes e a responsabilidade era imensa, pois tinha que recitar, conforme “manda o figurino”, pois, ali havia, além da platéia ( a cidade inteira mais convidados), a exigência da professora , que depositara em mim total confiança. Os ensaios foram inúmeros, sabatina da professora, confronto com o espelho, enfim... No dia do evento, quando fui anunciada no microfone, as pernas tremiam! Mas não exitei. Dirigi-me até o palco, onde já se encontrava além das autoridades, a professora, com o microfone na mão. A tensão foi grande! A professora aproximou-se de mim e disse: você é capaz! Sei que vai fazer bonito! Foram exatamente estas palavras que ouvi, (e daí em diante, não me recordo de uma palavra sequer que pronunciei), apenas das treze estrofes, do papel sujo e amassado onde continha o registro que li e reli inúmeras vezes, e,dos fortes aplausos durante alguns minutos que sucederam minha apresentação.
Este fato foi marcante em minha vida, pois vi naquele enorme papel com treze estrofes, na responsabilidade que assumira com a escola, e em mim mesma, a possibilidade de desafio e superação que estava posta na fragilidade de uma garota de sete anos. Impressiona-me ao recordar este fato, reconhecer a importância das palavras proferidas pela professora naquele momento, para o resultado positivo que todos esperavam. Hoje, quando estou frente a um obstáculo, procuro reviver na memória aquele momento e sempre que tenho oportunidade, procuro praticar a terapia do reconhecimento e encorajamento com aqueles que estão ao meu redor, por compreender, baseada na experiência que obtive, o quanto uma palavra pode significar, positiva ou negativamente, na vida de um ser humano.
Após a formação básica, já morando em Juazeiro, iniciei minha vida profissional, em 1988, em uma escola particular, considerada uma das melhores escolas de Educação Infantil, localizada no outro lado do Rio, na cidade de Petrolina – PE. Trabalhei com crianças de Educação Infantil em todas as etapas. Neste período, pude colocar em prática muito do que tinha visto na minha formação no magistério e ampliar consideravelmente os conhecimentos anteriores, principalmente no campo da educação infantil. Foi uma experiência enriquecedora e prazerosa, que vivenciei durante nove anos. Muito do que hoje sou profissionalmente, aprendi naquela escola. Grandes amigos lá conheci. Jamais esquecerei esta fase tão preciosa e significativa de minha vida!
O ano de mil novecentos e noventa, foi um marco na vida profissional. Neste ano, prestei vestibular para Letras na UPE/FFPP ( Faculdade de Formação de Professores de Petrolina), fui aprovada, e, em mil novecentos e noventa e um ingressei-me na Universidade. Trabalhava no diurno e estudava no turno noturno. Concluí o curso em mil novecentos e noventa e cinco (1º semestre).
Em 1998, fui convocada para trabalhar na Secretaria Municipal de Educação de Juazeiro, após aprovação em concurso público. Comecei trabalhando com alunos de Ensino Fundamental (1ª a 4ª séries), migrando para alunos de 5ª a 8ª séries, em seguida tive uma experiência como Coordenadora Pedagógica, Gestão Escolar, EJA (Educação de Jovens e Adultos). Atualmente estou como formadora do GESTAR, experiência valiosíssima! Muito tenho aprendido no contato com colegas, profissionais, que atuam na área de Língua Portuguesa, bem como nas formações e estudos proporcionados pelo programa.
Almejava ingressar na Rede Estadual de Educação, e, em 1999, prestei concurso público na rede, sendo aprovada para atuar no Ensino Médio na disciplina de Língua Portuguesa, iniciando minhas atividades em junho de 2000. Trabalhei durante oito anos em um colégio de grande porte como professora. Atualmente estou atuando como gestora, uma experiência árdua, em virtude dos grandes problemas que afetam a educação pública. Gerenciar uma escola pública tem sido para mim uma das mais difícies tarefas a qual me confrontei durante 21 anos atuando em educação. Um desafio, desafiador!
Atuei também no PROGRAPE (Programa de Formação de Professores de Pernambuco – UPE/FFPP. Deslocava-me de Juazeiro-Ba para Santa Maria da Boa Vista, 150 km de distância para ministrar aulas para professores que não tinham graduação, em um programa específico para esta categoria de profissionais. Trabalhava com Língua Portuguesa e Metodologia da Língua Portuguesa. Foi um período bastante enriquecedor, trabalhava com profissionais de larga experiência , que atuavam em escolas da sede e da zona rural. Conheci diversas realidades, diferentes práticas e, conseqüentemente, inúmeras dificuldades no exercício da profissão eram vivenciadas pelo grupo de 45 educadores inscritos no programa.
Em 2000, fiz Especialização em Educação de Jovens e Adultos ( UNEB). Uma das grandes conquistas, no que se refere ao meu crescimento profissional, ampliei meus conhecimentos específicos quanto ao estudo das Teorias Educacionais.Com as reflexões nos encontros, revi algumas concepções, conseqüentemente, confrontei-me com grandes dicotomias, no entanto, sem perder o encanto e a crença na transformação da sociedade através da educação.

Em 2009, fui convidada para atuar como formadora do GESTAR. Inicialmente, resisti, por compreender a responsabilidade a qual estaria abraçando, afinal, teria o contato direto com professores de larga experiência e qualificação. No entanto, coloquei-me a disposição do novo desafio, onde estou tendo a oportunidade de conhecer várias pessoas, trocar experiências e assim, aprender bastante. Está sendo uma fase de muita leitura e produção intelectual. E um ano atípico, pois, todo estudo teórico e prático, vista nas oficinas do GESTAR no ano anterior quando participei do programa como cursista, está sendo processada e adequada para os encontros e oficinas, desta vez, atuando como formadora. Nos encontros com as cursistas estou tendo a oportunidade de discutir, refletir, ouvir opiniões e experiências. Desta forma, meu processo de formação, auto-formação do conhecimento está sendo concreto, dinâmico e significativo. A vivência do GESTAR, como professora/formadora, permite-me experienciar efetivamente na prática o que é ser um professor pesquisador.
Considero-me uma profissional comprometida com o ensino da língua, e, principalmente com a qualidade social da educação, a qual, a escola deve estar imbuída em oferecer.
A leitura e a escrita me fascinam, a educação me embriaga. Dedico muitas tardes e longas noites ao estudo e a pesquisa; horas de feriados, domingos de muito trabalho.
Aprender, pra mim, não é uma atividade vinculada apenas ao exercício da profissão a qual abracei. É questão de necessidade interior, de auto-realização.
Este momento de rememorar minha história de vida leitora e escritora, esta retrospectiva, foi um momento valiosíssimo, emocionante, marcante. Jamais imaginaria que fatos tão remotos, viriam à tona com tanta veracidade, relevância, significado e emoção.
Um momento íntimo, ímpar, de inúmeras aprendizagens a qual, oportunamente, sou grata ao Gestar, a formadora da UnB, professora Valquíria, e a todos vocês que estarão em contato com um recorte destas experiências socializadas neste espaço.
Juazeiro, 27 de julho de 2009

Nenhum comentário:

Postar um comentário